Intervenção na íntegra:
“No passado dia 9 de abril, tive a honra de representar o sr. Presidente no evento “Transporte Ferroviário no Corredor Atlântico – compromisso da região centro” que decorreu na Guarda e reuniu várias dezenas de autarcas da região Centro.
Durante o evento foi assinada a declaração Regional Conjunta para defesa do transporte ferroviário do corredor atlântico europeu no troço ibérico, o qual integra uma série de projetos e investimentos estratégicos que visam modernizar, harmonizar e integrar as infraestruturas ferroviárias de Portugal e da Espanha no contexto da Rede Transeuropeia de Transportes (RTE-T), promovida pela União Europeia.
Mais concretamente no troço ibérico, do lado de Portugal, as principais ações incluem a Nova linha ferroviária de alta capacidade entre Sines, Évora e Elvas/Caia, numa linha dedicada essencialmente a mercadorias, mas igualmente preparada para o transporte de passageiros; Melhoria das ligações estratégicas aos portos, particularmente de Sines, Leixões e Lisboa para reforçar a capacidade logística e o transporte multimodal; e a Integração com os corredores logísticos nacionais, facilitando o acesso ferroviário aos polos industriais e logísticos.
Na sua versão mais recente (finais de 2024), a Rede Transeuropeia prevê essencialmente da construção das Linhas da Alta Velocidade (LAV) materializada em três ligações entre Portugal e Espanha, a saber:
- Porto-Braga-Vigo
- Corredor Internacional Norte com ligação entre Aveiro-Viseu-Guarda-Salamanca-Medina del Campo, com bifurcação para a Europa ou para Madrid
- Corredor Internacional Sul com ligação entre Lisboa-Évora-Elvas/Badajoz-Mérida-Cáceres-Plasencia-Toledo-Madrid
Se estes investimentos devem ser encarados como uma oportunidade para melhorar os transportes ferroviários à Região Centro, essenciais ao seu desenvolvimento territorial e económico, a definição das prioridades de investimento pode constituir uma ameaça que importa combater.
É publica a constituição de movimentos que em conjunto com Castela e Leão, defendem uma nova ligação do Porto/Aeroporto à alta velocidade em Espanha passando por Vila Real – Bragança – Zamora, pondo em causa a concretização do Corredor Internacional Norte, a única que atravessa e serve a Região Centro e, em particular a Região de Coimbra.
A concretizar-se tal hipótese, os planos para a Alta Velocidade poderão contribuir para isolar a Região Centro, colocando-a fora do caminho da competitividade, do desenvolvimento económico, regional e territorial. Portugal passaria a ser servido por 3 eixos de ligação a Espanha, sendo que nenhuma delas serviria a região centro. Uma viagem de Coimbra para Madrid e para Europa em Alta Velocidade obrigaria a que todos os viajantes de Coimbra a apanhar a LAV em Lisboa, Porto ou em Vigo, o que acrescentaria horas ao tempo de viagem e um eventual transbordo.
Quer os agentes defensores do Corredor Internacional Sul quer os da região Norte/trás-os-montes estão organizados nas suas reivindicações, pelo que também a Região Centro precisa unir esforços na defesa do corredor internacional norte.
Se é fundamental garantir que a LAV Porto-Lisboa efetue paragens com regularidade em Aveiro, Coimbra e Leiria, é igualmente fundamental garantir a ligação da Região Centro à vizinha Espanha por alta velocidade. Só este corredor permite melhorar as ligações transfronteiriças e integrar a região centro nas principais rotas ferroviárias europeias.
A união de forças que se formalizou na Guarda e que junta cerca de 70 municípios da região centro é essencial não só para defesa do transporte ferroviário do corredor atlântico europeu no troço ibérico como para reivindicar a concretização da linha de alta velocidade Aveiro-Viseu-Guarda-Salamanca-Medina del Campo.
É certo que a publicação no Diário da República, no passado dia 16 de abril do Plano Ferroviário Nacional (PFN) que visa reforçar a coesão territorial, melhorar a mobilidade sustentável e integrar o sistema ferroviário português na Rede Transeuropeia de Transportes (RTE-T), prevê a construção faseada de uma nova linha ferroviária entre Aveiro e Vilar Formoso, separando à semelhança do Eixo Atlântico, uma Linha de Alta Velocidade (LAV) para passageiros e a Linha da Beira Alta dedicada a passageiros e mercadorias, o que só por si, é um bom pronúncio. Contudo também é certo que os planos são dinâmicos e mutáveis, e sobretudo muito dependentes da disponibilidade e dos calendários do financiamento europeu. Tal constatação enfatiza a definição de prioridades de investimento e a necessidade da região centro se posicionar em relação a estas matérias.
Por isso e sem pôr em causa a absoluta primazia de investimento na ligação da LAV Porto-Lisboa, enquanto estratégia nacional, importa igualmente defender a importância estratégica do corredor internacional norte como prioridade de investimento. Numa fase em que as verbas são escassas, a aposta prioritária no corredor sul é um erro estratégico nacional. Senão vejamos:
- Madrid está sensivelmente à mesma latitude da Guarda, pelo que se constitui como a ligação privilegiada Portugal-Madrid. A ligação Lisboa-Madrid, via corredor norte, conjugada com a LAV Lisboa-Porto, para além de servir a área metropolitana de Lisboa (AML) serve em simultâneo Leiria, Coimbra, Aveiro, Viseu, Guarda, e a área metropolitana do Porto. Esta é ainda a oportunidade tão aguardada por Viseu para integrar a RTE-T, sendo que atualmente permanece sem ligações ferroviárias. Por oposição o corredor sul apenas serve a AML e Évora, desenvolvendo-se o traçado para norte através da Extremadura espanhola- a LAV serve o território espanhol em detrimento do nacional. É certo que o corredor sul envolve um custo mais reduzido, já que tira proveito da linha de mercadorias Porto de Sines – Madrid em fase de construção. Contudo o custo da infraestrutura não pode ser o único fator a ser avaliado na equação, sendo igualmente essencial avaliar os benefícios dai resultantes
- o corredor norte com a bifurcação em Medina del Campo, salvaguarda a ligação a Madrid através de Segovia, e assegura uma ligação direta à Europa (via Valladolid), sem necessidade de passagem e paragem em Madrid. Por oposição o corredor sul, as ligações à europa via corredor sul obrigam forçosamente a passar/parar em Madrid, com perda de competitividade em termos de tempo de percurso.
Com a construção da futura estação Intermodal de Coimbra, Coimbra reúne todas as condições para se constituir como um grande HUB ferroviário, garantindo a ligação a Espanha e ao resto da Europa seja para transporte de passageiros, através de Aveiro e corredor internacional norte, seja para transporte de mercadorias através da Linha da Beira Alta.
Em suma, a concretização do Corredor Internacional Norte é essencial e prioritário para assegurar a integração plena da Região Centro e de Coimbra na rede ferroviária de alta velocidade, promovendo a coesão territorial, a competitividade económica e o acesso equitativo às oportunidades de desenvolvimento que a mobilidade ferroviária e sustentável oferece. Este corredor, assume-se só por si suficiente para servir a maioria do território nacional. Inverter os investimentos, baseado no fator custo, como tem vindo a ser defendido, é um erro estratégico nacional, já que a relação custo-benefício é francamente inferior e não retira a necessidade de investimento num segundo corredor situado a norte.”